Refletindo o Evangelho do Domingo
Pe. Thomaz Hughes, SVD
PRIMEIRO DOMINGO DA QUARESMA - ANO B
Mc 2,12-15
“Durante quarenta dias, no
deserto, ele foi tentado por satanás”
Oração do dia
Concedei-nos,
ó Deus onipotente, que, ao longo desta Quaresma, possamos progredir no
conhecimento de Jesus Cristo e corresponder a seu amor por uma vida santa. Por
Nosso Senhor Jesus Cristo, Vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.
Evangelho (Marcos 1,12-15)
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Marcos.
1,12 E logo o Espírito
impeliu Jesus para o deserto. 13 Aí esteve quarenta dias.
Foi tentado pelo demônio e esteve em companhia dos animais selvagens. E os
anjos o serviam. 14 Depois que João foi
preso, Jesus dirigiu-se para a Galiléia. Pregava o Evangelho de Deus, e dizia: 15 "Completou-se o
tempo e o Reino de Deus está próximo; fazei penitência e crede no
Evangelho."
Palavra da Salvação.
COMENTÁRIO
Os três evangelhos sinóticos contam a história das
tentações de Jesus no deserto - Marcos de uma forma resumida, Mateus e Lucas
mais detalhadamente. Mas, devemos lembrar que esses relatos procuram expressar
uma experiência mística de Jesus, e então não devem ser interpretados ao pé da
letra ou de uma maneira fundamentalista!
Uma coisa logo chama a atenção – nos três Evangelhos
as tentações vêm logo após o batismo de Jesus! O batismo significava o assumir
público da sua identidade e missão, como Servo de Javé. Logo após esse
compromisso, Ele tem que enfrentar as tentações. Aqui a experiência de Jesus é
como a nossa própria - nós temos compromisso com o projeto de Deus, mas, entre
o nosso compromisso e a nossa prática do seguimento de Jesus, existem muitas
tentações!!
Marcos sublinha que “o Espírito impeliu Jesus para o
deserto”. O Espírito não conduz Jesus à tentação, mas é a força sustentadora
d’Ele, durante as suas tentações. Como o Espírito dava força a Jesus, Marcos
quer ensinar às suas comunidades que elas também poderão contar com este apoio
do Espírito Santo nos momentos difíceis da vivência da sua fé!
O relato mais desenvolvido de Lucas (Lc 4, 1-14) pode
nos ajudar a aprofundar o sentido das tentações de Jesus. Nelas podemos
reconhecer as mesmas tentações que nós, individualmente e comunitariamente,
enfrentamos na nossa caminhada da fé hoje! Primeiro, Jesus é tentado a mandar
que uma pedra se torne pão. Podemos ver aqui a tentação do “prazer” - logo que
enfrenta um sacrifício por causa da sua opção, Jesus é tentado a escapar dele!
Uma tentação das mais comuns hoje, em um mundo que prega a satisfação imediata
dos nossos desejos, criando necessidades falsas através de sofisticadas
campanhas de propaganda. Pois, vivemos em uma sociedade que prega o
individualismo, onde a regra é “se quer, faça!”, e onde sacrifício, doação e solidariedade
são considerados como ladainha dos perdedores! É só olhar o número de
casamentos que fracassam diante da primeira crise, ou a quantia de
seminaristas, religiosos/as e padres que desistem, às vezes pouquíssimo tempo
depois de professar os seus votos ou de se ordenar, diante de uma sentida falta
de “auto-realização imediata”. A resposta de Jesus é contundente: “Não só de
pão vive o homem”. O homem vive de pão certamente, mas não só! Jesus não é
sádico, contra o necessário para viver dignamente. Mas salienta muito bem que
não é somente a posse de bens que traz a felicidade, mas a busca de valores
mais profundos, como a justiça, a partilha, a doação, a solidariedade com os
sofredores. Não faz nenhum contraste falso entre bens materiais e espirituais –
ambos são necessários para que se tenha a vida plena! Nessa frase, Jesus
desautoriza tanto os que buscam a sua felicidade na simples posse de bens, como
os que dispensam a luta pelo pão de cada dia para todos!
A segunda tentação pode ser vista como a do “ter”. De
novo algo muito atual! Nós vivemos na sociedade pós-moderna da globalização do
mercado, do neoliberalismo, do consumismo, do “evangelho” do mercado livre.
Diariamente, a televisão traz para dentro das nossas casas a mensagem de que é
necessário “ter mais”, e que não importa “ser mais”! Como sempre, a tentação
vem em forma atraente - até a Igreja pode cair na tentação de achar que a
simples posse de bens, que podem ser usados em favor da missão, garantirá uma
pregação mais evangélica. Isso sem falar das pregações midiáticas que
glorificam um Deus que supostamente faz da posse de bens materiais sinal da sua
bênção! Somos tentados a não acreditar na força dos pobres, de não seguir o
caminho do carpinteiro de Nazaré. Jesus também teve que enfrentar esta tentação
- Ele que veio para ser pobre com os pobres, para mostrar o Deus que opta
preferencialmente pelos sofredores, é tentado a confiar nas riquezas! Para o
diabo - e para o nosso mundo que idolatra o bem-estar material e o lucro, mesmo
sacrificando a justiça social - Jesus afirma: “Você adorará o Senhor seu Deus,
e somente a ele servirá” (v. 8).
A terceira tentação pode ser entendida como a do
“poder”. Uma tentação permanente na história da Igreja e dos cristãos. Quantas
vezes a Igreja confiava mais no poder secular do que na fragilidade da cruz,
para “evangelizar”. Quanta aliança entre a cruz e a espada - a América Latina
que diga! Ainda hoje todos nós enfrentamos esta tentação - não de ter poder
para servir, mas de confiar no poder aparente deste mundo, mais do que na
fraqueza aparente de Deus. Jesus, que veio para servir e não para ser servido,
que veio como o Servo de Javé e não como dominador, teve que clarificar a sua
vocação e despachar o diabo com a frase: “Não tentarás o Senhor seu Deus” (v.
12).
Realmente, podemos nos encontrar nas tentações de
Jesus! São as tentações do mundo moderno - o ter, o poder e o prazer! Coisas
boas em si, quando bem utilizadas conforme a vontade de Deus, mas altamente
destrutivas quando tomam o lugar de Deus em nossas vidas! Jesus teve que
enfrentar o que nós enfrentamos - o “diabo” que está dentro de nós, o tentador
que procura nos desviar da nossa vocação de discípulos. O relato de Lucas nos
coloca diante da orientação básica para quem quer vencer: “Você adorará o
Senhor seu Deus, e somente a ele servirá” (Lc 4, 8).
Salmo responsorial 24/25
R. Verdade e amor, são os caminhos
do Senhor.
Mostrai-me, ó Senhor, vossos caminhos
e fazei-me conhecer a vossa estrada!
Vossa verdade me oriente e me conduza,
porque sois o Deus da minha salvação.
R. Verdade e amor, são os caminhos
do Senhor.
Recordai, Senhor meu Deus, vossa ternura
e a vossa compaixão, que são eternas!
De mim lembrai-vos, porque sois misericórdia
e sois bondade sem limite, ó Senhor!
R. Verdade e amor, são os caminhos
do Senhor.
O Senhor é piedade e retidão
e reconduz ao bom caminho os pecadores.
Ele dirige os humildes na justiça
e aos pobres e ele ensina o seu caminho.
R. Verdade e amor, são os caminhos
do Senhor.
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