Refletindo o Evangelho do Domingo
Pe. Thomaz Hughes, SVD
SÉTIMO DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO B
Mc 2,1-12
“Nunca vimos uma coisa assim”
O texto de hoje inicia uma série de cinco controvérsias entre Jesus e
diferentes grupos dentro do judaísmo da sua época (fariseus, escribas,
batistas, saduceus, herodianos), mostrando como o sistema religioso e político
vigente era incapaz de reconhecer a novidade da chegada do Reino de Deus e se
opunha a Jesus. Essa série vai de 2, 1 até 3, 6 e vai terminar com a frase
“faziam um plano para matar Jesus”. É como se Marcos quisesse mostrar-nos para
onde levaria a fidelidade de Jesus no seguimento da vontade do Pai. Já a Cruz,
começa a mostrar a sua sombra desde o início.
A primeira das controvérsias é gerada pela cura de um paralítico. Para
imaginar a cena, devemos lembrar que se trata de uma casa da Palestina antiga -
uma casa de um só andar, cujo teto em forma de terraço era feito de taipa - por
isso a facilidade em descer a maca pelo teto. Mas, aqui também se esconde uma
verdade sobre a vivência que Jesus quer - o paralítico dependia da
solidariedade dos outros para que chegasse ao local da cura. Não é possível o
verdadeiro seguimento de Jesus sem a solidariedade efetiva, especialmente com
os mais sofridos e frágeis da sociedade. Mais uma vez, Marcos enfatiza que a fé
precede o milagre, pois Jesus logo faz a cura “vendo a fé que eles tinham”. É
bom notar que a fé que Jesus notou era “deles”, isso é, não somente do
paralítico, mas dos companheiros que o levavam até Jesus.
Mas, também Jesus não se contenta com um milagre que somente sana o
sintoma do mal. Ele diz “os seus pecados são curados” - pois atrás de todos os
males do mundo há o pecado como raiz - seja pecado individual ou, muitas vezes,
social e comunitário. Como diz Paulo “a criação inteira geme como em dores do
parto”. Quantos sofrimentos hoje são causados pela ganância e corrupção
enraizadas na estrutura da nossa sociedade? Jesus ensina que não podemos nos
contentar somente com ações isoladas que dirimem alguns casos individuais - por
tão importantes que possam ser esses gestos de solidariedade. Também temos que
extirpar do nosso meio as raízes dos males - não com ritos esdrúxulos, mas com
ações organizadas, motivadas pela fé, para que construamos o mundo que Deus
quer, onde “todos tenham a vida e a tenha em abundância” (Jo 10, 10).
Mais uma vez, é interessante comparar no texto as reações das pessoas
diante da ação libertadora de Jesus. Os donos do poder, aqui representados
pelos doutores da Lei, ficam escandalizados e enraivecidos com Jesus, pois a
pregação e a ação d’Ele ameaçam o seu poder hegemônico sobre o povo. Mas, do
outro lado, o povo simples, sofrendo a opressão da classe dominante
político-religiosa, fica cheio de admiração e de alegria e louvam a Deus, pois
“nunca vimos coisa assim”. Sempre há quem se escandalize com a pregação ou ação
libertadora, pois querem a continuidade de um sistema opressor, seja ele
político, econômico, ou religioso, - ou muitas vezes uma combinação dos três,
pois frequentemente a religião é usada para justificar, em nome de Deus, a
exploração sócio-econômica da maioria.
A ação de Jesus é integral. Ele cura por fora e por dentro. Não podemos
nos contentar com uma ação que não tem essa integração - não há cura “interior”
a não ser que leve a um mundo material onde todos têm vida digna; mas, uma ação
que ataca os sintomas dos males também não surtirá efeito duradouro se não
atingir a raiz dos males - o pecado, a opção pelo mal, nos seus aspectos
individuais, sociais e comunitários.
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