Refletindo o Evangelho do Domingo
Pe. Thomaz Hughes, SVD
QUARTO DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO B
Mc 1, 21-28
“O que significa isso? Um
novo ensinamento, dado com autoridade”
Oração
Concedei-nos, Senhor nosso Deus, adorar-vos
de todo o coração e amar todas as pessoas com verdadeira caridade. Por Nosso Senhor
Jesus Cristo, Vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.
Evangelho
(Marcos 1,21-28)
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo
segundo Marcos.
1,21 Dirigiram-se para Cafarnaum.
E já no dia de sábado, Jesus entrou na sinagoga e pôs-se a ensinar.
22 Maravilhavam-se da sua
doutrina, porque os ensinava como quem tem autoridade e não como os escribas.
23 Ora, na sinagoga deles
achava-se um homem possesso de um espírito imundo, que gritou:
24 "Que tens tu conosco,
Jesus de Nazaré? Vieste perder-nos? Sei quem és: o Santo de Deus!
25 Mas Jesus intimou-o, dizendo:
"Cala-te, sai deste homem!"
26 O espírito imundo agitou-o
violentamente e, dando um grande grito, saiu.
27 Ficaram todos tão admirados,
que perguntavam uns aos outros: "Que é isto? Eis um ensinamento novo, e feito
com autoridade; além disso, ele manda até nos espíritos imundos e lhe obedecem!"
28 A sua fama divulgou-se
logo por todos os arredores da Galiléia.
Palavra da Salvação.
COMENTÁRIO
O evento relatado no texto de hoje demonstra um dos temas básicos do
Evangelho de Marcos - e de todos os Evangelhos - o confronto entre o Reino de
Deus, concretizado na pessoa e projeto de Jesus, e do mal, expressado, na
linguagem e mentalidade daquele tempo, na imagem de um homem doente “possuído
por um espírito impuro”. Marcos vai seguindo a caminhada de Jesus, sempre com
esta luta como pano de fundo, até o conflito definitivo no Calvário, que leva,
não através de milagres, mas da Cruz, até à vitória definitiva na Ressurreição.
Tipicamente, Marcos enfatiza que Jesus ensinava - mas, como é costume
dele, não nos explicita que Ele ensinava. Ilustra o conteúdo do ensinamento do
Mestre relatando uma ação d’Ele - a cura de um homem “possesso”, ou seja,
libertando alguém do domínio do mal. Aqui não devemos nos fixar na cosmovisão
da época - que tratava toda doença como expressão de um espírito mau – mas, em
que o evangelista quer nos mostrar, que na chegada do Evangelho do Reino
acontece a libertação verdadeira, onde o mal, o pecado, com todas as suas
expressões está derrotado pelo bem. No relato de hoje, com as imagens usadas,
os dois poderes estão frente a frente - o bem contra o mal.
Na história, o mal, falando através do homem, reclama contra a chegada
do bem: “O que queres de nós, Jesus de Nazaré? Vieste para nos destruir?” O
mal, mesmo quando disfarçado, nunca aceita a chegada de um projeto alternativo;
o poder que aliena e domina nunca aceita um ensinamento ou prática que liberta
e conscientiza. Isso continua até hoje - enquanto as Igrejas se limitam a ações
paliativas e assistenciais (sem negar o seu valor e urgência) diante do
sofrimento das massas, ninguém vai reclamar; mas, quando as atividades
eclesiais começam a conscientizar sobre as verdadeiras raízes do sofrimento do
povo, as Igrejas e seus agentes são perseguidos. Temos o exemplo hoje de bispos
proféticos como Dom Erwin Krautler, no Xingú, dos líderes indígenas e indigenistas
na região de Dourados-MS e muitos outros. Como dizia o saudoso Dom Helder
Câmara: “quando eu fazia campanhas em prol dos pobres, me diziam “o senhor é um
santo”, mas quando comecei a perguntar por quê existiam tantos pobres, me
falaram “o senhor é um comunista!” - e sabemos o quanto o santo Dom Helder foi
perseguido pelo poder dominador aqui no Brasil.
Então o relato nos ensina que com a chegada de Jesus – portanto, também
através da ação das comunidades dos seus discípulos/as - algo essencialmente
diferente acontece. Marcos sublinha isso pela reação do povo: “O que é isso, um
ensinamento novo, dado com autoridade?” A diferença do ensinamento de Jesus não
estava tanto no seu conteúdo, pois isso foi profundamente enraizado no Antigo
Testamento, mas na sua maneira de ensinar. Ele não dependia de citar
autoridades, como faziam os escribas, mas falava a partir da sua própria
experiência de Deus, do Deus da vida e não do Deus que estava ofuscado por
tantas leis, rituais e discussões legalistas e teológicas. Jesus devolveu ao
povo a sua autonomia de consciência, libertou-o da dependência nos escribas, e
revelou o verdadeiro rosto de Deus, que é partidário dos sofredores e
demonstrou que é vontade de Deus que toda força que aliena, domina e oprime
(aqui representada pela força demoníaca) seja derrotada pela mensagem
libertadora do Evangelho.
Cabe a nós, seus
seguidores/as, achar meios para praticar este projeto na nossa situação
concreta, não correndo atrás de milagres, de falsos Messias, de uma Teologia de
Retribuição ou de Prosperidade, mas seguindo o projeto do Nazareno, construindo
uma sociedade, uma economia, uma política de solidariedade, compaixão, justiça
e fraternidade. Que essa ação comece no “micro” - na nossa família, comunidade,
bairro, e Igreja, pois a opção entre os dois projetos de vida se dá cada dia,
em cada opção e ação nossa.
Oração
- Salmo 94/95
Não fecheis o coração, ouvi hoje a voz
de Deus!
Vinde, exultemos de alegria no Senhor,
aclamemos o rochedo que nos salva!
Ao seu encontro caminhemos com louvores
e, com cantos de alegria, o celebremos!
Vinde, adoremos e prostremo-nos por terra,
e ajoelhemos ante o Deus que nos criou!
Porque ele é o nosso Deus, nosso pastor,
e nós somos o seu povo e seu rebanho,
as ovelhas que conduz com sua mão.
Oxalá ouvísseis hoje a sua voz:
“Não fecheis os corações como em Meriba,
como em Massa, no deserto, aquele dia,
em que outrora vossos pais me provocaram,
apesar de terem visto as minhas obras”.
Não fecheis o coração, ouvi hoje a voz
de Deus!