Páscoa: Tempo de renascer!
Tempo de despertar para a vida nova!
Pe. Tomaz Hughes, SVD
Muitos de
nós, de uma certa idade, lembram ainda quando a Quaresma era observada com
muito rigor nas famílias e comunidades cristãs, com especial ênfase em privar-se
de algum bem - doces, bebidas, cinema ou algo semelhante. Que alegria quando
chegasse Sábado Santo, pois tudo isso terminou! Sem negar o valor das práticas
daqueles tempos idos, antes da reforma litúrgica do Papa Pio XII, a celebração
da Páscoa foi diminuída na sua importância e quase que desligada da caminhada
quaresmal.
O ponto alto do Ano Litúrgico é o Tríduo Pascal. Aqui
está resumido todo o mistério da nossa salvação, pela vida, morte e
ressurreição de Jesus. Na quinta à noite, comemoramos a Ceia que resumiu toda a
vida de Jesus. “Tendo amado os seus, amou-os até o extremo” (Jo 13, 1) - até o
último ponto de doação, dando a sua vida. Jesus nos deu o mandamento que deve
nortear toda a nossa vida - “façam isso em memória de mim!”. Não fazendo uma
lembrança de algo que já passou, mas o memorial - tornando presente tudo que
foi celebrado nessa ceia derradeira, e comprometendo-nos com o seguimento de Jesus
hoje, alimentados por seu Corpo e Sangue, numa vida de amor e solidariedade.
Há uma
ligação estreita entre todos os elementos do Tríduo, pois sexta-feira foi a
consequência lógica da vida de Jesus. Ele não veio para morrer, mas para que
“todos tenham a vida e a vida em abundância” (Jo 10, 10). Por isso, o seu
projeto do Reino bateu frontalamente com os projetos de dominação do seu tempo,
e por isso, ele foi assassinado. Fiel até o fim, assumiu as consequências da
fidelidade à vontade do Pai, e foi morto, e morto na Cruz. Desvinculado da
Quinta-feira Santa e do Sábado Santo, Sexta-feira seria a celebração de uma
derrota fragorosa. Por isso, depois de sentirmos a dor e a tristeza da sexta
feira, aparente vitória do mal, celebramos numa explosão de alegria a vitória
de Deus, do bem, na ressurreição de Jesus, garantia da nossa, através da
Liturgia Pascal.
Nos relatos dos Evangelhos,
certos elementos são comuns: o fato que o túmulo estava vazio, que as primeiras
testemunhas eram as mulheres, e que uma delas era Maria Madalena. Um fato salta
aos olhos - ninguém esperava a Ressurreição. A Cruz era o fim da esperança, a
maior desilusão possível. Se somarmos a isso o fato que todos eles traíram
Jesus (ou por dinheiro, ou por covardia), podemos imaginar o ambiente pesado
entre os discípulos na manhã do Domingo. Nisso, chegam a Maria e as mulheres
com a notícia do túmulo vazio. Pedro e o Discípulo Amado correm até o túmulo.
Enquanto Pedro vê sem acreditar, o Discípulo Amado acredita. Só quem olha com
os olhos do amor, penetra além das aparências!
Salta aos
olhos, mesmo com uma leitura superficial dos relatos evangélicos, que a
experiência da Páscoa fez uma reviravolta na vida dos discípulos e discípulas. De
um grupo de decepcionados, desiludidos, fracassados, se tornaram um grupo
dinâmico, evangelizador, animado, olhando a vida, com suas alegrias e
tristezas, de uma outra maneira. Isso fica claro no relato dos Discípulos de
Emaús, em Lucas 24, 13-35. Podemos sentir no desabafo do Cléofas sentimentos de
tristeza, decepção, desilusão, até revolta contra Jesus, por, aparentemente,
ter fracassado e destruído os sonhos e esperanças deles: “nós esperávamos
(notemos o tempo do verbo!) que fosse ele o libertador de Israel, mas... já faz
três dias que tudo isso aconteceu.” (Lc 24, 21). De repente, depois de ter
feito a experiência da presença de Jesus Ressuscitado, tudo muda: “Então, um
disse ao outro: Não estava o nosso coração ardendo quando Ele nos falava pelo
caminho e nos explicava as Escrituras?” Na mesma hora, eles se levantaram e
voltaram para Jerusalém, onde encontraram os Onze, reunidos com os outros” (Lc
24, 32-33).
Páscoa era
para eles, e tem que ser para nós, “tempo de renascer”. Mas, é bom notar - só
“renasce” o que morreu! Temos que descobrir em nós o que precisa renascer, o
que tem morrido, ou está agonizando! Pode ser a fé, a força, o ânimo, a
esperança, o engajamento na comunidade, a energia para lutar por um mundo
melhor. Todas essas coisas são capazes de renascer, se realmente fizermos a
real experiência da Páscoa, da ressurreição de Jesus. Não de uma maneira
sentimental e aérea, mas, realista. Para ressuscitar, Jesus teve que passar
realmente pela morte. Mas venceu a morte e continua a viver - e no meio de nós.
Lembremos como Paulo dava importância à Ressurreição. Escrevendo aos coríntios,
uma comunidade onde alguns “iluminados” negaram ou menosprezaram o fato da
Ressurreição, ele brada: “Se os mortos não ressuscitam, Cristo também não
ressuscitou. E se Cristo não ressuscitou, a fé que vocês têm é ilusória e vocês
ainda estão nos seus pecados... Se a nossa esperança em Cristo é somente para
esta vida, nós somos os mais infelizes de todos os homens (1Cor 15, 16-19).
Não há
dúvida que não é fácil manter sempre a esperança, a fé e a coragem diante de
tantas dificuldades na vida. Sempre foi assim. O autor anônimo de Hebreus,
escrevendo na segunda parte do primeiro século a uma comunidade judeu-cristã,
sabia disso, e falou: “Corramos com perseverança na corrida, com os olhos fixos
em Jesus... para que vocês não se cansem e não percam o ânimo, pensem
atentamente em Jesus” (Hb 12, 1c-3). A celebração da Semana Santa nos dá uma
oportunidade de fazer isso - olhar de novo atentamente para Jesus, o Verbo de
Deus, “que se fez homem e armou a sua tenda no meio de nós” (Jo 1, 14). Assim
podemos reanimar a nossa fé, a nossa missão, a nossa participação na comunidade,
olhando, recordando e celebrando o Jesus real, de mão calejada, que se tornou
igual a nós em tudo, menos o pecado. Se, apesar de ser abandonado por quase
todos e sentindo-se abandonado até pelo Pai, gritando, “Meu Deus, Meu Deus
porque me abandonaste” (Mc 15,34), mesmo assim foi fiel até o fim, foi
ressuscitado pelo Pai. Tempo de renovação, tempo de reviver, tempo de ânimo
novo, tempo santo - a celebração da Vida, Morte e Ressurreição de Jesus, “autor
e consumidor da fé” (Hb 12,3)
(Publicado no Boletim
Diocesano da Diocese de São José dos Pinhais - Abril 2012)
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